Self Portrait

Self Portrait

Saturday 16 November 2013

A última vela ardia sem cessar, faziam já algumas horas. Permanecia bela, quase capaz de esconder a sua inevitável fraqueza.
O correio daquela manhã esperava pacientemente, na velha mesa de pedra. Tentava desviar o olhar do delicado envelope, e fazia até o que não precisava de ser feito, como se tal pudesse fazê-lo evaporar. O tempo arrastava-se numa ânsia descontrolada - não podia adiá-lo por muito mais tempo. Sentou-se e respirou profundamente, enquanto envolvia a carta nas magras e gastas mãos. Abriu-a e respirou novamente, levando uma das mãos à testa, enquanto se preparava para o que estaria por vir.
Nunca fora dado a mistérios ou indecisões. Interessava-lhe o presente. O que assumia como certo. Fora-lhe prometida uma resposta e, até então, submetera-se a uma longa e fria espera que, por fim, terminara. Atingira o seu objetivo. Mas... e agora? Precisava de objetivos. Mais. Ainda não encerrara este e já sentia que lhe faltava algo. Era uma das razões pela qual gostava de viver no presente - o futuro leva-nos sempre ao fim de algo. Fim de nós próprios. O futuro é um casulo que se esqueceu de abrir - estava encurralado. O desespero começava, lentamente, a apoderar-se de si. O que se iria suceder? Não estava ele já fatalmente condenado?
Ergueu o olhar. Desdobrou o papel. À sua frente, nada. Uma delicada, frágil e indiferente folha em branco.
A última vela ardera durante horas. O calor ainda se fazia sentir. Oh, quão bela era. 

No comments:

Post a Comment

I'm empty, next to a body that doesn't move. Fill me with words. I love you.