Self Portrait
Friday, 31 January 2014
Tuesday, 28 January 2014
Saturday, 25 January 2014
Como as canções, há magia a viajar pelo mundo. Ou, pelo menos, assim rezam aqueles que dizem conhecer a história.
A lua ia alta quando Augustus acordou. Por um momento, olhou em redor e esfregou os olhos, para se certificar de que tinha escapado incólume aos terríveis pesadelos da noite, mais uma vez. Sentou-se na cama, com a ponta dos pés a tocar o chão frio. Noutra ocasião teria sido uma sensação bastante desagradável, mas devido ao mais recente sobressalto, soube-lhe bem. Sentiu o frio, e sentiu que era real. Estava a salvo.
Apoiou totalmente os pés no chão e levantou-se, dirigindo-se à única janela do quarto, por onde transbordava uma lagoa de luz lunar. Lá no alto, milhões de pequenas gotas brilhavam, na sua margem. Observou-as por momentos. Pareciam geladas ao toque. Quis tocar-lhes, mas não foi frio que sentiu. Vestiu rapidamente as roupas que encontrou mais à mão, calçou-se, e saíu sem mais demoras.
*
Quando ficamos às escuras muito tempo, as coisas começam a ficar mais nítidas. Ganham formas. Os contornos começam a fazer sentido e, de repente, é como se já vivêssemos ali desde sempre. Esse momento chegara.
Augustus estava velho - velho de corpo, mas não de alma. Vivia ali à tanto tempo... assim como a lua. A lua já reparara nele, mas ele nunca a vira. Já olhara para ela, uma ou outra vez, mas nunca a vira. Até esse dia. Tanto podia ter 70 anos, como 7. Não importava. O corpo não era o importante, mas sim a mente. Nela encontrou as respostas, nela foi capaz de preencher aquilo que qualquer indivíduo comum passa anos à procura - a solução para o buraco sem fundo que têm no peito, que não os deixa dormir.
Felicidade. Era possível, real. E estivera sempre ali, tão perto, dentro dele. Pudesse ele transformar-se e existir apenas no mundo metafísico... Ficara desperto. Sentia o fervilhar de emoções dentro de si. A magia estava prestes a renascer.
*
Nos dias que se seguiram, Augustus foi visto a dirigir-se com um determinado grupo de pessoas, cerca de cinco, a recantos sombrios da cidade, locais escuros, mas calmos e silenciosos. Foi uma mudança muito comentada, a princípio, pela gente que os observava. Com o tempo, os encontros tornaram-se menos frequentes, mas não menos importantes. Já ninguém reparava neles, quando apareciam.
Secretamente, planeavam criar um objeto capaz de captar a verdadeira essência das pessoas e transformá-las nisso mesmo: alma e pensamentos. Na sua visão idealista do mundo, os seres iriam muito para além do mundo físico, trespassando a barreira espiritual. Era o preencher do vazio.
O peculiar objeto era idêntico a uma câmara fotográfica instantânea. Uma vez usada, o efeito seria irreversível. Assim que alguém era fotografado, deixava de existir no mundo físico - a prova disso era o papel fotográfico, representação real e sentida - nunca mais apareceriam numa revelação, e nunca mais seriam vistos. De alguma forma, criaram a mais esplêndida forma de existir, um submundo, ou o "outro lado", como gostavam de lhe chamar. Todo um universo onde as almas coexistiam e eram belas pela sua essência, como uma vida de olhos fechados.
A solidão levou-os a encontrarem-se, e estava na altura de fazerem a passagem. Naquele momento, a cidade humana parecia-lhes vazia. Todos eles tinham almas distintas, mas naquele momento eram um só. A lua erguera-se - estava na hora.
*
Nunca mais ninguém ouviu falar de Augustus ou de qualquer uma das pessoas que o acompanhavam. Na verdade, só repararam nas suas casas inabitadas muito tempo depois, já ninguém vivo se lembrava de a quem pertenciam. Mas eles lá estavam, apesar de não se verem. Estavam lá, perfeitos e reais. Felizes e completos. Eram o luar. Eram a ponta dos pés frios depois de um sonho mau.
E a câmara... ela ainda anda por cá, há anos a vaguear pelo mundo, a abrir portas ao "outro lado" a mais almas com coragem suficiente para uma entrega total. Regida pelas leis da atração, vai captando a solidão deste e daquele, preenchendo os espaços vazios. O corpo não é o importante. A beleza está nos olhos de quem a vê. E se formos fortes o suficiente, podemos vê-la até no escuro.
Conhecemos o início, alguns meios, mas o fim ainda está por vir. E quando acontecer, ninguém o saberá. Seremos livres, de verdade - fantasmas de alma.
Friday, 24 January 2014
Temia a floresta como a floresta a temia a ela. O vento interpretava os seus passos e transmitia-os em sussurros rápidos. Quanto mais se embrenhava entre as árvores, mais pequena ficava - mas mais segura, também. Sendo tão insignificante naquela imensidão de vida, era-lhe mais fácil encontrar refúgio, mais fácil esconder-se em qualquer buraco no chão. O sol aquecia-a simplesmente por existir. Ali, ela era tudo e não era ninguém. Aqui, ela sou eu. As flores caem-me do cabelo e adormecem nas clavículas, embaladas pelos meus passos, quando regresso a casa.
Thursday, 23 January 2014
Wednesday, 22 January 2014
Monday, 20 January 2014
O vento seguia, apressado - mais apressado que nós, que já corríamos. Podíamos encher várias chávenas de café com chuva, se espremêssemos o cabelo. Depois aquecíamos a água, bebíamos tudo e enchíamos as chávenas com açúcar. Falávamos sobre castelos na areia e sobre as ondas que estão por vir, sobre nuvens mais negras, sobre pele. Partilhamos luvas no inverno, ou meios bolsos. E uma estrela brilha - brilha sempre. Hanta.
Sunday, 19 January 2014
Saturday, 18 January 2014
Friday, 17 January 2014
Thursday, 16 January 2014
Tuesday, 14 January 2014
Olhava, pálida, para lá do céu - as lágrimas já secas pelo sol de inverno preso do outro lado do vidro. Ele abanava-a, segurando-a pelos braços, e falava alto como se ela estivesse demasiado longe para ouvir. "O mundo era capaz de ficar melhor sem ti" - e, pela primeira vez em horas, um sorriso ergueu-se atrás de uma porta que bateu de fúria. Mas já não estava lá ninguém para ver.
Sunday, 12 January 2014
Saturday, 11 January 2014
Friday, 10 January 2014
Monday, 6 January 2014
As meias rasgadas, o negro dos sapatos de ponta gastos e uma aranha a passear na barra. Finjo a música, uma e outra vez, as lágrimas escondidas atrás de um lago castanho e os pés em sangue, a pintar sorrisos abstratos, que ninguém vê, de verdade, mas aceita que estão lá. A aranha mexe, a brisa arrepia-me da cabeça aos pés, levanto-me, mexo-me e gasto as contagens, mas não danço. Não consigo. As ondas beijaram o fogo e o fogo quis repetir
Saturday, 4 January 2014
O vizinho alto e escanzelado que nunca conheci esqueceu-se de tocar piano hoje para me acordar. Nunca o vi, mas sei que é assim porque já sonhei com ele várias vezes. Varre-me o corpo quando a tempestade faz barulho, divide-se entre as minhas pestanas e rega as flores mortas, quando pensa que não estou a ver. Vou deixar-lhe chá no tapete.
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